“Depois, os telefones ocupados, os desencontros de ontem e hoje. Sunday, bloody Sunday. É tão difícil me comunicar com ele. Às vezes eu penso em desistir, eu acho que não agüento essa aprendizagem toda outra vez — fico tentado a desistir. Não sei bem por que insisto, posso dizer apenas frases feitas sobre isso, mas na verdade não sei. Na cozinha, lavando pratos, lembro muito de minha mãe — compreendo tanto mais ela, agora. Compreendo tudo muito mais. Dói e é incômodo. Vontade de não saber perdoar, de não ser compreensivo, tolerante — de não me contentar com o pouco — “amor malfeito, depressa, fazer a barba e partir”. O domingo tá acabando — já é tarde — amanhã a gente começa de novo. Eu me sinto às vezes tão frágil, queria me debruçar em alguém, em alguma coisa. Alguma segurança. Invento estorinhas para mim mesmo, o tempo todo, me conformo, me dou força. Mas a sensação de estar sozinho não me larga. Algumas paranóias, mas nada de grave. O que incomoda é esta fragilidade, essa aceitação, esse contentar-se com quase nada. Estou todo sensível, as coisas me comovem. Tenho regressões a estados antigos, às vezes, mas reajo, procuro me manter ligado às coisas novas que descobri. Mas tudo fica e se sucede — quase nunca dá tempo de você se orientar, escolher — não gosto de me sentir levado — e aqui não dá tempo. Muitos grilos agindo, muita dúvida, umas voltas de insegurança. Faz tempo ando transferindo uma porção de providências — como é que a gente faz pra se manter sempre alerta? Eu não agüento tanta atividade física e mental.”
Caio Fernando Abreu
esse texto traduz tanto o momento =(
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