domingo, 8 de julho de 2012

Disfarces

"Faz de conta que amava e era amada, faz de conta que não precisava morrer de saudade...Faz de conta que vivia...faz de conta que tudo o que tinha não era faz de conta... faz de conta que ela não estava chorando por dentro."

Clarice Lispector






"Faz de conta que amava e era amada, faz de conta que não precisava morrer de saudade...Faz de conta que vivia...faz de conta que tudo o que tinha não era faz de conta... faz de conta que ela não estava chorando por dentro."

"Daqui pra frente , tudo vai ser diferente"



Tumblr_m5j7ja9irt1qez43mo1_400_large






“ Foi a última paixão. Paixão é o que dá sentido à vida. E foi a última. Tenho certeza absoluta disso. Agora me tornarei uma pessoa daquelas que se cuidam para não se envolver. Já tenho um passado, tenho tanta história. Meu coração está ardido de meias-solas. Sei um pouco das coisas? Acho que sim. "

sábado, 7 de julho de 2012

Sabia !



"Sabia ? Gosto de você chegar assim. Arrancando páginas dentro de mim desde o primeiro dia. Sabia? Me apagando filmes geniais. Rebobinando o século ,meus velhos carnavais, minha melâncolia. Sabia que você ia trazer seus instrumentos .E invadir minha cabeça.
Onde um dia tocava uma orquestra pra companhia dançar. Sabia que ia acontecer você, um dia .E claro que já não me valeria nada tudo o que eu sabia um dia"


Lola
Chico Buarque



sexta-feira, 6 de julho de 2012

Enganos




"Se era amor? Não era. Era outra coisa. Restou uma dor profunda, mas poética. Estou cega, ou quase isso: tenho uma visão embaraçada do que aconteceu. É algo que estimula minha autocomiseração. Uma inexistência que machucava, mas ninguém morreu. É um velório sem defunto. Eu era daquele homem, ele era meu, e não era amor, então era o que?
Dizem que as pessoas se apaixonam pela sensação de estar amando, e não pelo amado. É uma possibilidade. Eu estava feliz, eu estava no compasso dos dias e dos fatos.
Eu estava plena e estava convicta. Estava tranqüila e estava sem planos. Estava bem sintonizada. E de uma dia para o outro estava sozinha, estava antiga, escrava, pequena. Parece o final de um amor, mas não era amor. Era algo recém-nascido em mim, ainda não batizado. E quando acabou, foi como se todas as janelas tivessem se fechado às três da tarde num dia de sol. Foi como se a praia ficasse vazia. Foi como um programa de televisão que sai do ar e ninguém desliga o aparelho, fica ali o barulho a madrugada inteira, o chiado, a falta de imagem, uma luz incômoda no escuro. Foi como estar isolada num país asiático, onde ninguém fala sua língua, onde ninguém o enxerga. Nunca me senti tão desamparada no meu desconhecimento. Quem pode explicar o que me acontece dentro? Eu tenho que responde às minhas próprias perguntas. Eu tenho que ser serena para me aplacar minha própria demência. E tenho que ser discreta para me receber em confiança. E tenho ser lógica para entender minha própria confusão. Ser ao mesmo tempo o veneno e o antídoto.
Se não era amor, Lopes, era da mesma família. Pois sobrou o que sobra dos corações abandonados. A carência. A saudade. A mágoa. Um quase desespero, uma espécie de avião em queda que a gente sabe que vai se estabilizar, só não sabe se vai ser antes ou depois de se chocar com o solo. Eu bati a 200Km/h e estou voltando a pé pra casa, avariada.Eu sei, não precisa me dizer outra vez. Era uma diversão, uma paixonite, um jogo entre adultos. Talvez seja este o ponto. Talvez eu não seja adulta suficiente para brincar tão longe do meu pátio, do meu quarto, das minhas bonecas. Onde é que eu estava com a cabeça, Lopes, de acreditar em contos de fadas, de achar que a gente manda no que sente e que bastaria apertar o botão e as luzes apagariam e eu retornaria minha vida satisfatória, sem seqüelas, sem registro de ocorrência?
Eu nunca amei aquele cara, Lopes. Eu tenho certeza que não. Eu amei a mim mesma naquela verdade inventada. Não era amor, era uma sorte. Não era amor, era uma travessura. Não era amor, era sacanagem. Não era amor, eram dois travessos. Não era amor, eram dois celulares desligados. Não era amor, era de tarde. Não era amor, era inverno. Não era amor, era sem medo. Não era amor, era melhor."




quarta-feira, 4 de julho de 2012

A Fila Anda

"Quem me apresentou à expressão foi Fábio Júnior, o cantor. Ele tinha acabado um casamento relâmpago de artista e sua explicação chegou aos jornais com franqueza desconcertante: “A fila andou”. Por alguns segundos eu não entendi, depois fiquei passado. Como alguém diz uma grosseria dessas? E a consideração pela outra pessoa, não existe? 
Isso faz tempo. Desde então, a expressão se banalizou. Toda mundo fala e todo mundo escreve. Só nos últimos dias, deparei com “a fila anda” na capa de uma revista e numa propaganda de perfume. A metáfora pegou e parece que vai ficar no nosso vocabulário e no nosso comportamento: as filas andam mesmo, de forma cada vez mais rápida. Ninguém quer ficar parado. 
Antes de continuar, uma confissão: eu tenho dificuldade com esse tipo de andamento. Para mim a fila anda bem devagarzinho, quando anda. Às vezes fica parada por muitos anos, e é bom assim. Dá tempo de conversar, relaxar, ser feliz. Ficar sozinho, sem fila nenhuma, é meio aflitivo, mas acontece – e de vez em quando é necessário. Se você corre de uma fila para outra, ou fica preocupado em manter cheia a sua fila, acaba entediado ou perdido ou meio desesperado. Para mim não serve.
Apesar disso, reconheço virtudes na ideia de que a fila anda.
A primeira é lembrar a mim, a você e a todo mundo que os tempos do abuso sentimental acabaram. Se você não tratar as pessoas direito, elas irão embora. É simples assim. Todos têm opções e contam com o amparo das leis e dos costumes para procurar o melhor para si mesmo. A oferta afetiva é enorme. Em toda parte há gente disponível e atraente, de todos os tipos e de todas as idades. Saber que a fila anda ajuda a prestar atenção na pessoa ao nosso lado. Quem gosta cuida, diz o clichê. Mais do que nunca ele está certo. 
Outra coisa positiva na expressão “a fila anda” é que ela nos põe de frente com um aspecto inevitável da realidade: a transitoriedade de boa parte das relações. A depender da nossa idade ou do meio em que a gente vive, a fila vai andar mesmo, o tempo todo, goste-se ou não. Faz parte. Quando a gente é adolescente, acha que o primeiro amor vai durar a vida toda. Não dura. O mesmo acontece na juventude. A gente se apaixona, se desapaixona, dispensa, é dispensado, sofre, faz sofrer. A fila anda da mesma forma que a vida anda – até que algo importante a faça parar. O que há de errado nisso? Nada. 
Mas há na nossa cultura sentimental um componente masoquista que não combina com a simplicidade da fila que anda. Temos a expectativa equivocada de que todas as emoções serão eternas. Quando as coisas acabam, nos despedaçamos. Em vez de olhar para frente e tentar recomeçar, nos achamos no direito de empacar, insistir, implorar, perseguir. Temos a vocação do melodrama. A dor inevitável das rupturas é ampliada pela sensação de injustiça. Nos achamos vítimas do outro, e há um prazer medonho em sentir-se assim.
Tem gente que acha isso natural, eu acho que é aprendido. Acho que de alguma forma dizemos para as nossas crianças que amor é para sempre e que o fim de uma paixão equivale ao fim do mundo. As músicas dizem isso, as novelas sugerem isso. Há uma indústria cultural gigantesca que se alimenta da dor de cotovelo e da sensação de abandono. A troca de parceiros e a experimentação da juventude, que poderiam ser celebradas como bons momentos da vida, viram uma preparação angustiada para o compromisso, a busca apressada do verdadeiro amor, um breve período de promiscuidade que antecede a escolha definitiva.
Por trás da nossa atitude descolada, há expectativas que não são modernas nem liberais. Por isso nos apegamos a quem nos tiraniza (“ele me ama”) e desabamos quando a fila anda. Por isso queremos morrer. É claro que eu estou exagerando, mas não muito.

Nossa breguice sentimental, que é o oposto da “fila anda”, leva a situações esdrúxulas. Outro dia presenciei um amigo de 26 anos consolando um cara da idade dele que falava em se matar por ter sido deixado pela namorada... Onde ele aprendeu esse tipo de comportamento?
As pessoas não falam em se matar quando são reprovadas no vestibular ou demitidas de um emprego bacana, como acontece no Japão. Mas acham natural pensar essas bobagens depois de um pé na bunda. É isso que eu chamo de breguice - e não tem o menor cabimento.
Quando se considera isso tudo, não acho tão ruim dizer que “a fila anda”. A expressão pode denotar frieza e desrespeito pelos outros. Pode ser sinônimo de uma atitude egoísta e utilitária. Mas pode, também, sinalizar uma percepção saudável e corajosa das relações humanas. A fila anda, a gente avança, lá na frente descobre coisas melhores. Sempre de cabeça erguida. Melhor do que ficar choramingando, né?"